«Contra a Amazon» de Jorge Carrión
Um autor que diz ser contra a Amazon, mas defende o modelo de livraria em que se cobra uma entrada aos clientes e que estima distâncias urbanas em minutos de Uber. O que o aflige, contrariamente ao que o título escolhido para esta colectânea de textos possa sugerir, não são os malefícios do capitalismo. Afinal, é graças ao capitalismo e às suas iniquidades e práticas encantadoras que o autor pode circular pelo mundo, em viagens ultra poluentes e extremamente baratas graças às abébias dadas pelos governos às transportadoras aéreas, para cumprir esse desígnio honroso e nada narcísico que é visitar lojas (livrarias) e relatar essas visitas.
O problema contra a Amazon é que lhe dá cabo das lojas que gosta de visitar, porque pratica preços impossíveis para essas livrarias. Claro que não oferece uma só reflexão sobre o facto de, para os mais pobres (aqueles que não são bem vindos nas livrarias, pelo menos segundo a minha experiência pessoal) os «preços da Amazon» até representarem uma possibilidade mais alargada de acesso ao livro.
Se as viagens e leituras em barda fossem realmente o meio de crescimento interior e alargamento de vistas de que tanto se fala, certamente que o autor poderia ter oferecido algumas reflexões sobre os muitos milhões em impostos não cobrados que permitem que as viagens de avião possam ser baratas, mas não haja qualquer empenho dos governos em co-financiarem os livros, pelo menos os havidos como canónicos, ou dispensarem cobranças/garantirem apoios destinados a diminuir o preço dos livros. Seria certamente mais pertinente do que massagens de ego sobre como é um leitor extraordinário ou relatos de encantamentos matarruanos que se julgam muito cosmopolitas.