O ano de leituras foi aberto com o «Karmen» de Guillem March e com o vol. 4 de «The Far Side® Gallery 4». Mas o marco leitor desta pobre (em números) quinzena foi «O Cemitério de Praga» de Umberto Eco.
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Que o senhor Eco era um fã de conspirações, portador de uma ironia infinita para com todo o tipo de mistificações, já se sabia. Mas «O Cemitério de Praga» é a materialização de uma soberba caixa de areia para brincadeiras infinitas com esta sua matéria de eleição. Nada ali deixa de ser utilizado para a pura diversão do escritor. O leitor que se segure, que escreva notas, ou que se deixe ir (recomenda-se esta terceira opção). Eco não acumulou milhares (lendo uma quantidade assinalável) de livros para depois não se divertir tanto quanto podia a parodiar plúrimas conspirações e mitos, e ainda a usar tropos narrativos nessa celebração lúdica do que é contar uma história.
Este livro terá como pecado maior a intensidade e a insistência. É que nem todos os dias se está com vontade de ler narradores tudo menos fiáveis, desprezíveis e vis até ao tutano, ainda que sabendo-os caricaturas de modelos dignos destas adjectivações. Sim, o anti-semitismo e a misoginia tal como manifestados pelos narradores são hilariantes. Mas é factual que neste livro se tem que ler muito discurso anti-semita e misógino. Talvez demasiado.
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À pergunta «seria feliz a comer apenas bolo de chocolate o resto da minha vida» aprendi com «The Far Side® Gallery 4» que a resposta é não. No termo de um jornal diário um painel assenta muito bem. Muitos compilados num livro são puro enfado.
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A arte de «Karmen» é superior ao argumento, ainda que viva à boleia de opções fáceis para chocar. Mas a paleta é sublime. Coisa que o argumento fica a parsecs de alcançar.
Falhas de comunicação, isolamento social, e a enésima historieta de um limbo entre a vida e a morte de uma personagem em provação.
Adolescência tardia num bildungsroman de netflix para as massas. Só que com aura de culto. Vá-se lá saber porquê.